Viola na rede

Por Sérgio Santa Rosa

Atualmente, a música chamada de sertaneja raiz ou caipira encontra espaço em inúmeras rádios pelo Brasil afora. Porém, muitas vezes ela ainda está confinada ao gueto dos horários da madrugada e início da manhã. Seu espaço é pequeno se comparado ao obtido pela voraz invasão mercadológica, industrial e publicitária, do chamado sertanejo romântico, estilo musical no qual houve a substituição das violas por guitarras elétricas e teclados e a incoporação de elementos da música pop internacional. Nas letras das canções, os valores propagados pelo homem do campo foram substituídos pelas lamentações amorosas ou pelas exaltações de eventos festivos, sem relação com as festas tradicionais rurais.

Mas para além dos seus bastiões radiofônicos, a música caipira vai dando seu recado também na rede mundial de computadores. Sites, redes sociais, fóruns, web rádios e podcasts vão conectando artistas e apreciadores desse gênero musical e dos valores e costumes que ele evoca.

 “A comunicação virtual, sobretudo nesse momento de pandemia, ganhou muita relevância. A tecnologia simplifica as coisas e permite que mais pessoas produzam conteúdos”, afirma Ivan Vilela.

De Taguatinga, em Brasília, o violeiro Luiz Borges, filho de família mineira acostumada com a vida na roça e com as folias de reis, produz, grava e edita seu podcast “Cachaça, Prosa & Viola”. Criado a partir da paixão de Borges pela viola caipira, seu interesse em conhecer pessoas e ouvir suas histórias de vida, o podcast também divulga a cena musical caipira contemporânea e traz muitas informações sobre cachaça. 

Com o podcast, a pessoa não fica mais presa a aquele horário da madrugada ou início da manhã para ouvir música caipira ou uma boa prosa. O conteúdo fica disponível no site ou nos agregadores de podcast, e a pessoa pode escutar quando e onde ela quiser”.

Borges não tinha nenhuma experiência anterior no rádio. Mas sempre ouviu com atenção os grandes comunicadores caipiras de sua região, como Luiz Rocha, o Compadre Juarez Fernandes e Volmi Batista. Hoje, seu podcast é ouvido em todos os estados brasileiros. Com exceção da África, o “Cachaça, Prosa & Viola” também registra audiência em todos os continentes.

“São brasileiros que moram fora. Nas mensagens que eles nos mandam, falam muito de saudade de ouvir as coisas da nossa terra”.

No ar desde julho de 2019, Borges tem ouvintes mais velhos. Alguns deles, pouco familiarizados com a internet, sentem dificuldades de baixar e ouvir o podcast. Mas pedem auxílio aos mais jovens e vão curtindo o som da viola, muitas vezes ao lado de seus filhos e netos.

 “São pessoas que sentem essa saudade do tempo que moravam na roça, das músicas que não são mais ouvidas no rádio e na televisão. E, pelo retorno que tenho, os ouvintes mais jovens gostam porque faço uma apresentação e uma abordagem mais jovial, falando de temas da atualidade, do panorama da viola caipira e da produção de cachaça”.

Criado na capital paulista, com o rádio da casa sempre sintonizado no programa do inesquecível Zé Béttio, Chico Almeida, pelas circunstâncias da vida, acabou indo morar em Pardinho. Na cidade, situada numa região conhecida como um dos principais polos geradores da música raiz participou de eventos ligados à cultura local como a Cavalgada do Ferreirinha e o Festival de Música Raiz de Pardinho.

Seu forte envolvimento com os eventos culturais de Pardinho resultou na criação, em 2017, da web rádio “Casa dos Caipiras”. Com 24 horas no ar, apresentando programação ao vivo e gravada, a rádio ocupa o primeiro lugar no segmento sertanejo no Estado de São Paulo e o quarto em música sertaneja no Brasil, e já ultrapassou a marca de 70 mil ouvintes por mês. Hoje a rádio tem uma equipe que cuida de seu site, das redes sociais, do conteúdo veiculado e, em breve, contará com um estúdio profissional exclusivo para suas atividades. O acervo de mais de 10 mil músicas vem sendo atualizado constantemente para acompanhar o surgimento das novas duplas pelo Brasil afora.

A “Casa dos Caipiras” também tem audiência em muitos países. Há ouvintes assíduos, que interagem diretamente com o Chico e a equipe da rádio, em países tão diversos como Espanha, Rússia, Alemanha, Portugal, Panamá, Japão, Argentina, Bélgica e Estados Unidos. No território nacional, a rádio alcança todas as regiões e vem crescendo significativamente no Nordeste. Pelo contato que tem com os ouvintes, Chico dá sua interpretação do fenômeno. 

“Nas décadas de 1950 e 1960, muitos nordestinos vieram para São Paulo tentar uma vida melhor. Aqui, no seu radinho de pilha, em casa ou no trabalho, ouviam programas de música caipira como o do Zé Béttio. Muitos formaram suas famílias aqui, criaram os filhos e alguns voltaram para suas cidades de origem. De lá, eles acessam a rádio para ouvir as músicas que aprenderam a gostar naquela sua época em São Paulo”.

A audiência da “Casa dos Caipiras” é formada em boa parte por pessoas que buscam as lembranças do passado, do trabalho na roça e das origens familiares. Mas Chico identifica um interesse cada vez maior de jovens que sempre viveram nas cidades, até mesmo longe das regiões de origem desse tipo de música. 

“O caráter pejorativo do termo caipira está mudando. Hoje tem caipira médico, advogado, ou seja, nos mais diversos segmentos sociais. A rejeição à música caipira também está mudando. Quem conhece a poesia, as muitas músicas maravilhosas desse universo, começa a entender que as canções são histórias de vida, de lugares, de tradições e começa a valorizar. Todos os dias os novos ouvintes vão descobrindo belezas dessa música”. 

O movimento de revalorização da cultura caipira, notadamente a música, é evidenciado pelo grande número de jovens que buscam descobrir os segredos das dez cordas da viola em escolas de música por todo o país. Podem influenciar esse cenário, como lembra Ivan Vilela, fatores como a presença do extraordinário violeiro Almir Sater nas novelas de televisão, a valorização e a preservação da diversidade cultural e até mesmo a frustração do sonho de sucesso na cidade grande. Também pode pesar na balança o crescente fastio de segmentos da população com o consumismo exagerado e a busca de sucesso financeiro a qualquer preço, que resulta na busca por novos valores norteadores da vida, como a solidariedade, honestidade e o sentido de comunidade, tão caros aos interioranos. 

“Em relação ao caipira, em vez de olharmos como alguém atrasado, poderemos vê-lo como alguém que resistiu a uma onda de desenraizamento que atinge hoje pobres e ricos, cultos e incultos, crianças e idosos”, analisa Vilela. “Seria melhor se olhássemos o caipira não como atrasado, mas sim como o que resiste. Pela via da cultura é possível não nos esquecermos de quem sempre fomos”.

Para ouvir: Web radio Casa dos Caipiras

Aprenda a tocar um instrumento musical: o Centro Max Feffer Cultura e Sustentabilidade oferece cursos regulares de viola e violão. Para mais informações: (14) 3886.1491

Quer saber mais sobre a importância do rádio para a difusão da música caipira? Acompanhe a nossa série sobre o Rádio em nosso site e redes sociais!

Não perca também em nossa Programação, o Café com Viola Especial, que será transmitido no dia 11/10, no canal do YouTube e terá o rádio como tema central da prosa!

Siga o Centro Max Feffer nas Redes Socias:

Comments

  1. gostei muito do seu site, sempre volto para ver conteudo
    tão bem elaborado…

  2. gostei de tudo no site, tudo bem explicado.

  3. obrigado por nos ajudar…sucesso.

  4. muito boas as dicas desse site. sempre venho ver as
    novidades.

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Captcha Plus loading...